Os autores do conflito sudanês cometeram violações generalizadas, sendo que o grupo paramilitar Forças de Apoio Rápido (RSF) forçou raparigas e mulheres a casar na capital, Cartum, segundo um relatório da Human Rights Watch.
O relatório de 89 páginas, publicado domingo, intitulado "Cartum não é seguro para as mulheres: violência sexual contra mulheres e raparigas na capital do Sudão", documenta a violência sexual generalizada, bem como os casamentos forçados de mulheres e crianças, como parte do conflito em Cartum e nas cidades adjacentes.
O pessoal de ajuda humanitária referiu testemunhos de mulheres e de raparigas que afirmam terem sido detidas pelas RSF em condições "que podem ser comparadas à escravatura sexual", alertou a organização não-governamental (ONG).
No relatório salienta-se o impacto "devastador na saúde física e mental dos sobreviventes, o impacto devastador dos ataques beligerantes aos centros de saúde e o bloqueio deliberado da ajuda humanitária pelas Forças Armadas Sudanesas (SAF)".
"É da maior importância ouvir directamente os sobreviventes de violência sexual e recolher as suas experiências, opiniões e pedidos, num ambiente que garanta a sua segurança e dignidade. No entanto, salvo raras excepções, este relatório não inclui testemunhos directos dos próprios sobreviventes", lamentou a directora-adjunta para a África da Human Rights Watch (HRW), Laetitia Bader.
Segundo a ONG, dadas as restrições de acesso a Cartum, os desafios de segurança aí existentes, a falta de serviços para os sobreviventes e os obstáculos logísticos, a HRW entrevistou 42 profissionais de saúde, assistentes sociais, psicólogos, advogados e membros de unidades de resposta a emergências sediadas em Cartum entre Setembro de 2023 e Fevereiro de 2024.
Uma das excepções é o testemunho de uma rapariga de 20 anos que vivia em Cartum no início de 2024 e que disse que dormia "com uma faca debaixo da almofada durante meses", por medo dos ataques das RSF.
"Desde o início desta guerra, ser mulher em Cartum, que está sob o controlo das RSF, significa estar em perigo", lamentou a testemunha.
Os profissionais de saúde encontraram várias sobreviventes que necessitavam de tratamento para lesões incapacitantes sofridas durante as violações, incluindo violações colectivas, salientou, acrescentando que pelo menos quatro mulheres morreram dessas mazelas.
"Muitas sobreviventes que tentaram interromper a gravidez após a violação enfrentaram barreiras consideráveis no acesso ao aborto. As sobreviventes descreveram ou apresentaram sintomas indicativos de stress pós-traumático e de depressão, incluindo pensamentos suicidas, ansiedade, medo e insónias", frisou.
Há relatos de elementos das RSF a agredir mulheres e raparigas à frente das suas famílias e a forçarem outras a casar.
Existem menos casos atribuídos às SAF, mas foi registado um aumento do número de incidentes depois destes combatentes terem tomado o controlo de Omdurman no início de 2024. Homens e rapazes também foram violados, sobretudo durante a detenção, salientou a ONG.
"Ambos os lados do conflito bloquearam o acesso dos sobreviventes aos cuidados de saúde necessários", declarou.
As SAF restringiram deliberadamente os fornecimentos humanitários, incluindo os fornecimentos médicos, e o acesso dos trabalhadores humanitários, impondo um bloqueio aos fornecimentos de saúde às áreas controladas pelas RSF em Cartum desde, pelo menos, Outubro de 2023, explicou.
Ambos os autores do conflito intimidaram, detiveram arbitrariamente e atacaram médicos, enfermeiros e socorristas voluntários, em especial por ajudarem sobreviventes de violação. Em vários casos, elementos das RSF envolveram-se em violência sexual contra prestadores de cuidados de saúde, disse a HRW.
"Qualquer violência sexual perpetrada no contexto de um conflito constitui um crime de guerra", recordou.
A obstrução deliberada e as restrições arbitrárias à ajuda humanitária também violam o direito internacional humanitário, e a pilhagem e os ataques a civis, incluindo trabalhadores de saúde, constituem também crimes de guerra, salientou.
A União Africana e as Nações Unidas devem "colaborar imediatamente no envio de uma nova missão de protecção de civis para o Sudão, nomeadamente para prevenir a violência sexual e baseada no género, apoiar a prestação de serviços abrangentes a todos os sobreviventes e documentar a violência sexual relacionada com o conflito", concluiu. (RM-NM)
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