Pelo menos uma pessoa morreu hoje na manifestação que reuniu mais de duas mil pessoas em Cartum e que foi reprimida pela polícia, em mais uma nova jornada de protestos contra o golpe militar de 25 de Outubro
Com a morte do manifestante de hoje, baleado no peito pela polícia, sobe para 74 o número de vítimas mortais nos protestos contra o golpe militar, segundo um comunicado do sindicato independente do Comité de Médicos do Sudão, que contabiliza as vítimas e feridos nas manifestações e oferece assistência médica.
Os manifestantes concentraram-se nos bairros do sul da capital, Cartum, antes de se dirigirem até ao palácio presidencial, ocupado pelo comandante em chefe do Exército e líder de facto, Adbel Fattah al-Burhane, entoando palavras de ordem como "A autoridade é a autoridade do povo e o militar está no quartel" ou "Civil...civil, não militar", segundo um correspondente da agência espanhola Efe.
Seguindo o mesmo padrão dos muitos protestos que têm sido realizados desde 25 de Outubro, as forças de segurança recorreram ao uso de bastões e gás lacrimogéneo quando os manifestantes chegaram à rua do palácio.
De acordo com números preliminares fornecidos por paramédicos, mais de 20 pessoas tiveram que ser tratadas por ferimentos e asfixia causados pelas granadas de gás lacrimogéneo.
Em Durman, cidade vizinha de Cartum, houve duas manifestações e cerca de 3.000 pessoas participaram em outro protesto em Wad Madani, capital do estado central de Al Jazeera, disseram testemunhas oculares à Efe.
Protestos contra os militares também foram realizados nas cidades de Gedaref, Kassala, Port Sudan e Al Obeid.
No domingo, os autodenominados "Comités de Resistência" no Estado de Cartum anunciaram uma "semana de tensão" que inclui manifestações e o bloqueio das ruas da capital para exigir a devolução do poder aos civis.
Com o golpe de Estado de 25 de Outubro de 2021, o chefe do exército, general Abdel Fattah al-Burhane, interrompeu a transição para um poder inteiramente civil prometido há mais de dois anos, após a queda do ditador Omar al-Bashir, sob pressão do exército e da rua.
O partido Umma, o mais antigo do país, com vários dirigentes presos durante o golpe, voltou hoje a reiterar, em comunicado, o que os manifestantes costumam gritar: é preciso "apagar todos os vestígios do golpe", para voltar a um governo civil e "remover imediatamente o líder dos golpistas e seu o poder".
Como tem ocorrido sempre na véspera das manifestações à noite, as forças de segurança realizaram no domingo incursões, prendendo membros dos "Comités de Resistência" em diferentes distritos de Cartum, indicaram essas organizações locais, a verdadeira espinha dorsal da mobilização.
A comunidade internacional, por sua vez, tem vindo a aumentar os apelos ao diálogo e a ONU continua a encontrar-se com os diversos atores do país sem que tenha conseguido reuni-los até o momento.
O general Al-Burhane anunciou recentemente um governo "encarregado dos assuntos atuais", composto por altos funcionários e ministros de antigos grupos rebeldes armados.
O Sudão vive um impasse político desde o golpe militar de 25 de Outubro de 2021, que ocorreu dois anos após uma revolta popular, protagonizada já então pelos comités de resistência, para remover o autocrata Omar al-Bashir e o seu Governo islamita em Abril de 2019.
Sob pressão internacional, os militares reinstalaram em Novembro o primeiro-ministro deposto no golpe, Abdallah Hamdok, para liderar um Governo tecnocrata, mas o acordo não envolveu o movimento pró-democracia por detrás do derrube de Al-Bashir.
Desde então, Hamdok não conseguiu formar Governo perante protestos incessantes, não só contra o golpe de Estado, mas também contra o seu acordo com os militares e acabou por se demitir em 02 de Janeiro.
As Nações Unidas preveem que 30 por cento dos sudaneses vão precisar de ajuda humanitária este ano. (RM /NMinuto)
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